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    Há 20 anos, a música se despedia de Luiz Bonfá, compositor de ‘Manhã de carnaval’ e outros sucessos

    Pedro Paulo Malta

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    Neste dia 12 de janeiro de 2021 completam-se 20 anos da morte de um dos maiores nomes da nossa música popular, Luiz Bonfá, o carioca que, não bastasse ser um dos protagonistas da história do violão brasileiro (como João Pernambuco, Garoto, Baden Powell, Raphael Rabello e poucos mais), é autor de algumas das músicas mais tocadas mundo afora. Aqui no site da Discografia Brasileira ele pode ser encontrado em 162 ocorrências, sendo 108 como autor, 49 como intérprete e cinco pelo acompanhamento – fora os conjuntos em que tocou em sua bem-sucedida trajetória no Brasil e no exterior.

    Uma parte importante deste sucesso se deve ao filme “Orfeu negro”, produção de 1959 dirigida pelo francês Marcel Camus a partir da peça “Orfeu da Conceição”, escrita por Vinicius de Moraes e encenada pela primeira vez em setembro de 1956, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Depois de participar da montagem teatral como violonista solista, Bonfá foi convidado a compor novos temas para a versão cinematográfica, que ganharia a Palma de Ouro do Festival Cannes em 1959 e o Oscar de melhor filme estrangeiro em 1960.

    Entre as composições que fez para o filme estão “Rancho do Orfeu” (em parceria com o ator Haroldo Costa, intérprete do protagonista no teatro) e duas com letra de Antônio Maria: “Samba do Orfeu” e “Manhã de carnaval”, sendo esta segunda – cantada no filme por Agostinho dos Santos – o maior sucesso de sua obra e também uma das canções brasileiras mais conhecidas pelo mundo, com gravações emblemáticas de Frank Sinatra (1969), Joan Baez (1963) e os três tenores Luciano Pavarotti, Plácido Domingo e José Carreras (2001).

    No site da Discografia Brasileira são ao todo dez ocorrências do samba em discos de 78 rotações – todos lançados em 1959. Entre os destaques estão as gravações de João Gilberto (lançada em julho), Peri Ribeiro (agosto), Maysa (outubro) e Carlos Galhardo (dezembro), esta última em ritmo de marcha-rancho. Sobre a letra, o pesquisador e escritor Jorge Mello informa – no verbete sobre Bonfá que escreveu para o site Violão Brasileiro – que o plano inicial do compositor era ter a parceria do cronista Rubem Braga, mas este declinou, indicando Antônio Maria.

    No mesmo texto, Jorge Mello ressalta a proximidade entre seu biografado, o multi-instrumentista Garoto, e Luiz Bonfá, que disse à revista Guitar Player (fevereiro de 1997) que Garoto foi sua “única grande influência”: “Nos reuníamos na casa dele em Copacabana e tocávamos por horas a fio. Ele já tinha, no início dos anos 50, um balanço diferente, era mais avançado que os outros.” Com Garoto, Bonfá formou o conjunto Clube da Bossa, que era atração na Rádio Nacional e pode ser ouvido aqui no site tocando o choro “Meu cavaquinho” (do próprio Garoto) e o tango brasileiro “Ameno Resedá” (Ernesto Nazareth), em gravações de 1946.

    Antes do Clube da Bossa, outras bases foram fundamentais na formação do músico, nascido no Rio de Janeiro, em 17 de outubro de 1922. A primeira em casa, no bairro carioca de Santa Cruz, onde cresceu ouvindo o pai, músico amador que “se dizia seresteiro” e era amigo de Pixinguinha e Bororó. “O estímulo musical vem daí, de presenciar, desde menino, essas reuniões lá em casa”, contou Bonfá ao músico Mário Adnet, em matéria especial para o jornal O Globo (01-06-2000). Foi o pai – também chamado Luiz Bonfá – que o incentivou a tocar violão (aos sete anos) e o encaminhou ao outro personagem decisivo em sua trajetória, o violonista uruguaio Isaías Sávio, que foi seu professor, “gostava muito dos clássicos e tinha uma influência espanhola muito forte”.

    Foi também pelas mãos de Bonfá pai que o adolescente Luiz fez as primeiras apresentações em público, entre 1935 e 36, quando tocou seu violão em cassinos, clubes e programas de calouros no rádio – numa dessas ficou conhecido como “O Menino de Ouro da Rádio Guanabara”. Só na década seguinte faria as primeiras gravações, como integrante de conjuntos como o trio Los Campesinos, que era liderado pelo paraguaio Amado Smendel e aqui na Discografia Brasileira é representado por um único disco. Este, lançado em julho de 1945, traz no lado B aquela que consta como a primeira composição gravada de Bonfá: a rumba “Buenas noches señorita”, parceria dele com Smendel.

    Outras composições de Luiz Bonfá foram registradas nesse mesmo ano pelo próprio violonista na Continental, em gravações com acompanhamento do baterista Gaúcho. “My boogie woogie” foi lançada em agosto de 1945, enquanto “My old bass” e “Remember to you” saíram no mês de novembro. Já em abril de 1946, gravou numa mesma faixa outros três temas instrumentais de sua autoria: “I get lost”, “Lucy” e “Laís”.

    Ainda em 1946 ingressou no Quarteto Quitandinha, que mudaria de nome para Quitandinha Serenaders e era formado também por Luiz Telles, Alberto Ruschel e Francisco Pacheco, o Chicão, responsável pelo convite. Com o conjunto – no qual permaneceu de 1946 a 52 – Bonfá viajou o país, participou de filmes e realizou inúmeras gravações, como a primeira da famosa toada “Felicidade” (Lupicínio Rodrigues), em setembro de 1947. “Começou a chover na minha horta”, comentou o músico na entrevista a Mário Adnet.

    Da terra irrigada vieram os primeiros sucessos (como o samba-canção “De cigarro em cigarro”, gravado por Nora Ney com a orquestra de Copinha em 1953), o convite para tocar na peça “Orfeu da Conceição” (1956) e, nessa mesma época, a parceria com Tom Jobim. Dela brotaram “Engano” (lançada por Dóris Monteiro em 1956), “A chuva caiu” (Ângela Maria, 1956), “Domingo sincopado” (Edu da Gaita, 1956) e “Amor sem adeus” (Dick Farney, 1960). A música mais conhecida da dupla, “Correnteza”, só foi lançada após a era dos discos de 78 rotações, em 1973, na voz do cantor Luiz Cláudio.

    Até que chegou 1957 e lá se foi Luiz Bonfá para os Estados Unidos. “Cheguei lá sem saber o idioma, sem grana e com o violão debaixo do braço. Fiquei hospedado numa pensão em Nova York e andava o dia inteiro atrás de trabalho”, recordou o violonista na entrevista a Mário Adnet, a quem contou que um dos programas mais recorrentes era tocar de graça em festas. “Numa dessas festas, fui observado por uma grande cantora que fazia grandes musicais na Broadway, chamada Mary Martin. Foi aí que tudo começou.”

    Veio a extensa discografia no exterior (inaugurada em 1958, no selo estadunidense Atlantic), a participação no famoso show de bossa nova no Carnegie Hall (novembro de 1962), um disco com a cantora francesa Caterina Valente (1963), LPs em parceria com sua esposa (a cantora e compositora Maria Helena Toledo) e outros marcos importantes, como por exemplo a única composição de um brasileiro gravada por Elvis Presley: “Almost in love”, criação de Bonfá lançada em 1970, em um disco do rei do rock.

    Já a música “The gentle rain”, composta por Bonfá – com versos de Matt Dubey – para o filme homônimo de Burt Balaban (1966), recebeu gravações de craques do jazz, como Quincy Jones (1965), Joe Pass (1967), George Benson (1971), Oscar Peterson (1971), Toots Thielemans (1975), Charlie Byrd (1980), Sarah Vaughan (1981) e Diana Krall (1997), entre outros. Sem contar a primeira gravação, no disco com a trilha do filme "The gentle rain", dividido com o pianista e arranjador Eumir Deodato, grande fã de Bonfá: “Ele sempre foi o meu guitarrista favorito”, disse na matéria de Mário Adnet.

    Os anos 1970 ainda trouxeram discos importantes em sua trajetória, com destaque para os gravados na RCA Victor dos Estados Unidos, como “The new face of Luiz Bonfá” (1970), “Introspection” (1972) e “Jacarandá” (1973). Nas décadas seguintes os lançamentos foram mais espaçados, até que em 1996 saiu o marco final de sua discografia: o CD “Almost in love”, com exemplares de sua obra gravados com a cantora Ithamara Koorax.

    Luiz Bonfá tinha 78 anos quando faleceu, no dia 12 de janeiro de 2001, sendo sepultado na mesma data no cemitério Jardim da Saudade, no bairro Jardim Sulacap, na zona oeste do Rio de Janeiro.

    Foto: Coleção José Ramos Tinhorão / IMS

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